Mão na massa

Aprendi cedo que brigadeiro artesanal é feito por gente e não por máquina

Era o primeiro semestre de vida da Maria Brigadeiro. Eu estava feliz, fazendo 30 brigadeiros sabáticos por dia e comendo, sem pressa, meu miojo com queijo de saquinho, quando um primo rico, empresário de capa de Exame, foi coagido pela minha avó nonagenária a me dar conselhos de como progredir nos negócios.

A primeira providência a ser tomada, segundo ele, seria mecanizar o processo de produção, ou seja, nunca mais mexer uma panela de brigadeiro na vida. Fiquei confusa, pois tinha largado o jornalismo justamente pra me debruçar no fogão. Mas os homens que usam terno e gravata sempre tem argumentos convincentes: “É preciso criar mercado para esse seu brigadeiro diferente, aposte nos bufês, que compram grandes quantidades para festas. E para ganhar em escala você vai precisar de uma máquina”.

Claro que não existia uma máquina para brigadeiro, fomos em várias fábricas de equipamentos industriais e, por fim, voltei para casa com um geringonça de fazer coxinha, que foi adaptada para a função brigadeiro. No primeiro teste, passei a noite abrindo lata de leite condensado. Tudo para o lixo, junto com outros 10 kg de chocolate e mais 5 kg de manteiga, fundidos numa maçaroca grudenta que parecia piche.

Foram meses insones fazendo testes noturnos na tal máquina de coxinha, enquanto de dia preparava, na panela, os brigadeiros das encomendas que recebia. Os pedidos foram crescendo e sobrava cada vez menos tempo para testar a máquina. Apesar do esforço e do prejuízo, o máximo que eu tinha conseguido até então era um doce gosmento, com gosto de bala de café que eu não tinha coragem de dar nem para o Torresmo, a cachorro chocólatra da vizinha, que me adotou como dona.

O tempo passou e quando me dei conta, estava fazendo 3 mil brigadeiros por dia. E tudo na panela, do jeito artesanal que eu acreditava que ele tinha que ser feito. Ou seja, enquanto eu me preparava para atender um suposto mercado de bufês, um outro, que ninguém supunha existir, o de consumidores ávidos por um novo brigadeiro, surgiu organicamente, bem debaixo do meu nariz.

Se o brigadeiro-coxinha tivesse dado certo, o brigadeiro gourmet não existiria, pois ele teria que voltar à sua fórmula original (com baixo custo de produção e ingredientes de menor qualidade) para fechar a conta do bufê e a minha. A vida sabe o que faz. Já a gente, nem sempre._mg_0452

3 comentários em “Mão na massa

  1. a prova de que os sonhos são parte da realidade próspera se confirmarmos firmemente neles, ainda que absurdos ou longínquos o verdadeiro amor e dedicação para o que gostamos de fazer nos faz mais puros, e isso revigora e transparece no que fazemos. parabéns.

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